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Café Analítico

Medo da morte

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Chegamos a um momento da pandemia que, dificilmente, não tenhamos alguém próximo ou ao menos um conhecido que tenha perdido a vida para a Covid-19. Então, um tema tão pouco abordado por nós, aqui do ocidente, eclode junto à mais dura realidade: a morte. Não estávamos acostumados a falar, a conviver e a aceita-la. Numa cultura que preza pelo belo, pela eterna juventude, falar sobre o morrer e a finitude da vida é um tabu, uma sombra negada, mas que está junto a nós, por onde a gente for. Pode ficar ao lado, nas nossas costas, ou bem à nossa frente… dependendo de onde esteja vindo a luz.

Por não a ter acolhido, inserida em nossa cultura como uma etapa do próprio desenvolvimento humano, a dificuldade em assimilá-la e aceita-la torna-se um desafio a mais nesse período pelo qual estamos passando.

Buscando inspiração e remexendo antigos arquivos encontrei um conto budista muito bacana que ilustra o morrer e a sua aceitação:

Há muito tempo, no Tibete, uma mulher viu seu filho, ainda bebê, adoecer e morrer em seus braços, sem que ela pudesse fazer nada. Desesperada, saiu pelas ruas implorando que alguém a ajudasse a encontrar um remédio que pudesse curar a morte do filho. Como ninguém podia ajudá-la, a mulher procurou um mestre budista, colocou o corpo da criança a seus pés e falou sobre a profunda tristeza que a estava abatendo. O mestre, então, respondeu que havia, sim, uma solução para a sua dor. Ela deveria voltar à cidade e trazer para ele uma semente de mostarda nascida em uma casa onde nunca tivesse ocorrido uma perda. A mulher partiu, exultante, em busca da semente. Foi de casa em casa. Sempre ouvindo as mesmas respostas.  “Muita gente já morreu nesta casa”; “Desculpe, já houve morte em nossa família”; “Aqui nós já perdemos um bebê também”. Depois de percorrer a cidade inteira sem conseguir a semente de mostarda pedida pelo mestre, a mulher compreendeu a lição. Voltou a ele e disse: “O sofrimento me cegou a ponto de eu imaginar que era a única pessoa que sofria nas mãos da morte”.

Temos a tendência em negá-la pelo nosso desejo mais profundo da imortalidade, por isso a vemos como inimiga ou adversária. Então, a ideia de finitude vira pânico e inconformismo da vida que chega ao fim. É o nosso medo do desconhecido, da ruptura afetiva e do sofrimento.

“Ó doçura da vida: Agonizar a toda hora sob a pena da morte, em vez de morrer de um só golpe”.  William Shakespeare

Café Analítico

Por: Camyle Hart

Graduada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Estadual de Ponta Grossa em 1999, atuando por 15 anos na área, em diversos veículos de comunicação do Paraná. Pós-graduada em Comunicação e Mercado na Era Digital.

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