COVID-19
Médico defende a estratégia de “testar, rastrear e isolar” para combater pandemia
O cardiologista Dr. Rodrigo França, em entrevista ao Jornal Mensageiro, destacou experiências que deram certo em outros países e a necessidade controlar a disseminação do vírus de forma eficaz, com menor impacto econômico
Texto por Ana Cláudia Valério . Fotos por Divulgação . 13 de julho de 2020 . 17:30
JORNAL MENSAGEIRO: O Dr. falou na estratégia “testar, rastrear e isolar” como eficiente para combater a Covid-19. O que é necessário para que isso seja feito e por que é a melhor forma de controlar a doença?
DR. RODRIGO FRANÇA: A Covid-19 é uma doença que está na comunidade, então para seu controle, medidas que atuem na comunidade são essenciais. Nosso objetivo é reduzir ao máximo o número de infectados, com o menor impacto econômico. Quando olhamos a experiência de outros países que estão em fase mais adiantada da epidemia, observamos exemplos onde isso deu certo. No Japão, a estratégia baseia-se apenas em evitar os 3Cs, traduzindo seria evitar Aglomerações, Contatos Próximos e Espaços fechados. Além do uso de máscaras e higiene pessoal. Eles controlaram a epidemia se baseando nisso apenas, sem fechamentos amplos do comércio. Agiram na comunidade, mas isto exige ampla aderência do indivíduo. Não fazer encontros, festas, churrascos, roda de chimarrão, ir visitar amigos, familiares. Outros países ou regiões como Coreia do Sul, Hong Kong além do que foi feito no Japão, fizeram testagem, rastreio e isolamento, o que também foi efetivo. Todos com sintomas (febre, tosse, falta de ar) devem ser testados e isolados. Este isolamento deve ser orientado (quarto separado, treinar familiares na forma de contágio). Nas casas onde isso não for possível, o isolamento deve ser feito em locais disponibilizados pelo poder público (hotéis, escolas, por exemplo). Se apenas se disser para o doente ficar em casa, sem isolá-lo, vai contaminar os familiares e estes continuarão contaminando os outros. Isso seria o Isolamento Central, que é essencial. Além disso, equipes do Serviço de Saúde devem de forma proativa identificar quem são os contatos próximos dos doentes identificados. Deve rastreá-los através de aplicativos (Coreia fez isto) ou de entrevistas com o doente, já no momento do diagnóstico. Todos os contatos próximos, mesmo que assintomáticos, devem ficar em isolamento, semelhante aos doentes, até que tenham o resultado do exame de pesquisa do vírus negativo ou no mínimo por 10-14 dias. Não adianta testes para detectar anticorpos (teste rápido), tem que ser para detectar o vírus (Swab, cotonete).
A Coreia do Sul fez ampla testagem e se seguíssemos a mesma proporção em Medianeira, seriam em torno de 20 exames/dia. Ao se olhar esses exemplos, que controlaram a epidemia com o menor impacto econômico, teremos mais chances do que tentativa e erro. Fechar o comércio parcialmente, em determinados horários, tem o objetivo de reduzir os contatos e com isto diminuir a disseminação do vírus. Além de várias críticas do ponto de vista epidemiológico, não temos exemplos de onde isso foi aplicado e deu certo. Ao restringir horário de abertura você tende a concentrar mais pessoas no horário que está aberto. Ao deixar em casa, sem isolar doentes, você tende a disseminar mais o vírus entre os contatos domésticos. Este último decreto do governador (nº 4942/2020) aumentou o isolamento de 38% para 40%, muito pouco e com grande impacto econômico. A outra estratégia que diminui a disseminação é o lockdown por 4 a 8 semanas, onde fecha-se tudo, impede-se com a Lei a movimentação. Isto é medida extrema feita em alguns países, funciona, mas existem outras formas menos radicais, já realizadas e que deram certo.
Outras sugestões (já utilizadas em outros países) seriam: permitir colocação de mesas de restaurantes na calçada e na rua mesmo (talvez a noite fechar parte da avenida para carros e permitir mesas de restaurantes durante a pandemia). Com isso, evita-se aglomerações/espaços fechados. Ampliar horário do comércio até 22h, mas não permitir aglomerações, mais tempo de abertura, menos pessoas por hora atendidas.
Reitero, portanto, que com esta estratégia: evitar os 3Cs, usar máscara, higiene, testar, isolar, rastrear muitos países controlaram a epidemia, sem necessidade de amplo fechamento do comércio.
JORNAL MENSAGEIRO: Sobre o fechamento do comércio, por que é ineficaz?
DR. RODRIGO FRANÇA: A ineficácia foi comprovada pela pouca redução na mobilidade encontrada antes e após o decreto. Junto com isso, em teoria, ao não isolar os doentes, rastrear e isolar os contatos, estaria se concentrando infectados assintomáticos em casa, aumentando risco de transmissão domiciliar. É uma estratégia sujeita a estas críticas e onde não temos exemplos que deu certo.
JORNAL MENSAGEIRO: Sobre a testagem, seria em massa ou somente de doentes sintomáticos? E quanto aos assintomáticos? Há testes disponíveis e seguros?
DR. RODRIGO FRANÇA: Teste para identificação do vírus (RT-PCR ou equivalente) em todos os sintomáticos e contatos mesmo que assintomáticos, com isolamento do doente, sem contaminação dos familiares, manter isolamento por 14 dias nos positivos. Nos negativos avaliar repetir exame, pois tem 30% de chance de falso negativo. Esta é a estratégia proposta. Testes “rápidos” para detectar anticorpos tem muito pouca utilidade.
Os testes devem ser em sintomáticos e contatos para busca do vírus e não de anticorpos. Existem testes feitos pelo SUS em Foz do Iguaçu. Existem testes na rede particular com resultado no mesmo dia, feitos em Medianeira. Se não focarmos nisso e viabilizarmos a quantidade necessária de testes, não estaremos seguindo estratégias que deram certo, sem fechamento amplo do comércio. Existem profissionais de epidemiologia, de saúde pública que podem auxiliar nas formas de se fazer esta estratégia, é só copiar de onde deu certo.
JORNAL MENSAGEIRO: Os sintomas são muito diversos, já que o vírus se manifesta de formas diferentes, como detectar precocemente para evitar piora e mais contaminações?
DR. RODRIGO FRANÇA: A maioria das transmissões são no período pré-sintomático (2 dias antes dos sintomas) e por assintomáticos. Então se não isolar precocemente todos os sintomáticos, de forma central, inclusive da família, não se controlará a epidemia. Junto com isso, rastreio e isolamento dos contatos, mesmo assintomáticos, pois são os que transmitem, podendo estar contaminados e em período pré-sintomático ou serem apenas disseminadores assintomáticos. Precisam ser isolados por 10 a 14 dias ou até ter 1 ou 2 exames negativos. Detecção precoce em assintomáticos é através do rastreio de contatos (entrevista perguntando a todas as pessoas com quem o doente teve contato próximo, estimular instalação de App de celular entre outros).
JORNAL MENSAGEIRO: Questões sobre profilaxia, tratamento precoce e medicamentos, como Ivermetcina e Hidroxicloriquina, surgem a todo instante. Quais as orientações quanto a isso?
DR. RODRIGO FRANÇA: Inicio minha resposta falando de Hidroxicloroquina (HCQ) – existe plausibilidade biológica, isto é, em teoria a medicação pode inativar a entrada do vírus na célula humana e reduzir a infecção. Testes feitos em pacientes graves, internados, após vários dias de doença não mostraram benefício e alguns riscos. O uso profilático foi testado e não mostrou benefícios. Neste estudo profilático, em pessoas que não estavam internadas, não houve aumento do risco, além de não ter benefícios. O uso nos primeiros 2 a 3 dias do início dos sintomas, ainda não foi testado de forma definitiva. Existem relatos de casos e estudos observacionais que sugerem uma associação benéfica, ainda a ser confirmada. Então, ainda não há dados que permitam um protocolo. Médico e paciente devem, após ser explicado ao paciente os riscos e benefícios, decidir pelo uso ou não e assinar um termo onde afirma ter sido orientado. O uso profilático, até a data de hoje, foi testado e não demonstrou benefícios. A Ivermectina tem plausibilidade biológica. Destrói o vírus “in vitro”, isto é, fora do corpo humano. As quantidades da droga para fazer isso dentro da pessoa são muito altas, acima das tóxicas. Mesmo assim existem estudos em andamento, mas nenhum conclusivo. No momento sem evidências de utilidade como profilático. Como tratamento, segue a mesma lógica da Hidroxicloroquina. Volto a ressaltar que se algum destes medicamentos tiver algum efeito, provavelmente será pequeno. O foco para controle da epidemia deve ser na comunidade, testar, rastrear, isolar, evitar 3Cs, uso de máscaras e higiene. Isto salva vidas. As medicações se o fizerem é em uma escala bem menor.
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