EDUCAÇÃO
Comunidade se mobiliza para o não fechamento do CEEBJA de Medianeira
Autoridades, professores e alunos veem a medida como um retrocesso e destacam os prejuízos para a educação
Texto por Ana Cláudia Valério . Fotos por tanner . 22 de abril de 2021 . 11:27
Três unidades de CEEBJA (Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos) na região estão correndo o risco de serem fechadas. Os estabelecimentos de ensino ficam nas cidades de Matelândia, Medianeira e São Miguel do Iguaçu.
Desde o recebimento da notificação do Núcleo Regional de Educação de Foz do Iguaçu, informando aos municípios sobre o possível fechamento para otimização da logística, autoridades, professores e alunos se mobilizaram. “A primeira medida foi conversarmos com o Coordenador da EJA (Educação de Jovens e Adultos) na SEED (Secretaria da Educação e do Esporte) em Curitiba, no mesmo dia em que recebemos a notificação da cessação. Este nos informou que ele responde pelo pedagógico e que sobre esta reestruturação ele não saberia responder. Ou seja, o pedagógico, que é o cerne da educação, que é fundamental ser ouvido, pois trata-se de educação de pessoas e não de alocar coisas, não foi ouvido. Em seguida, procuramos informar alunos, professores, funcionários e iniciamos uma intensa mobilização regional, visto que a medida atinge os CEEBJAs de Medianeira, Matelândia e São Miguel do Iguaçu, ainda mais antigos do que o nosso. Os três atendem outros municípios, pois recebemos alunos de Missal, Itaipulândia, Ramilândia, Céu Azul, Serranópolis do Iguaçu. Nos reunimos com o executivo municipal, com vereadores que estão sensíveis à perda na educação, especialmente a professora Delcir e o professor Muniz, que sabem da essência dessa proposta desastrosa, e que não estão medindo esforços para auxiliar a educação do município”, informou a diretora do CEEBJA de Medianeira, Inês Tereza Menegazzo.
Caso a proposta venha a se concretizar, os alunos do CEEBJA serão alocados na Escola Olavo Bilac, na modalidade EJA. “Tanto o executivo quanto o legislativo de Medianeira estão trabalhando para que não ocorra esse retrocesso para o município e região. O legislativo aprovou no dia último dia 05 o envio de expediente ao Secretário de Estado da Educação e do Esporte e à Chefe do Núcleo Regional de Educação, solicitando o cancelamento da decisão de fechamento do CEEBJA. Na semana passada nos reunimos com a Secretária de Educação, Clair Rugeri, que também demonstrou apoio à causa, pois sabe de quantos prejuízos os munícipes terão se este Centro de jovens e adultos vier a fechar”, salientou Inês.
A vereadora Delcir Berta Aléssio, que integra a comissão de Educação da Câmara de Vereadores, destaca ainda que há uma demanda crescente para a ampliação do CEEBJA nos demais períodos. “Ao invés de fechar, precisamos trabalhar para a abertura de turmas nos períodos matutino e vespertino, bem como ampliar as turmas do período noturno, já que a demanda por este modelo de escola aumenta a cada dia”.
O Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos, atende desde adolescentes a partir de 15 anos até idosos. Em Medianeira existe há 24 anos, desde 1997, e funciona no período noturno, anexo à Escola Olavo Bilac. Hoje conta com 342 alunos: sendo 165 no ensino médio e 177 no fundamental. Destes, oito alunos surdos, um cadeirante, nove alunos especiais com laudo, dois adolescentes menores de 18 anos acompanhados pela psicopedagoga da AMOA. “A matriz curricular abrange quatro semestres, tanto no fundamental quanto no médio, e cada semestre finaliza uma etapa de ensino. No fundamental, os semestres 1 e 3 são iniciais, com conteúdos de sexto e sétimo ano; nos semestres 2 e 4 são ministrados conteúdos de oitavo e nono ano. Ao final de dois anos o aluno conclui o ensino fundamental. O ensino médio também é finalizado em dois anos”, detalha a diretora.
Sobre os prejuízos para os alunos e para o município, Inês destaca que sempre se perde quando se fecha uma escola. “Educação deveria ser pauta de avanços e não de retrocessos. Educação deve ser considerada como investimento e não como gasto. A especificidade dos alunos do CEEBJA precisa de um olhar pedagógico diferenciado, que hoje possuímos com excelência. Trabalhamos também com foco na função reparadora da EJA, que, no limite, significa não só a entrada do circuito dos direitos civis pela restauração de um direito negado: o direito à uma escola de qualidade, mas o reconhecimento da igualdade de todo e qualquer ser humano. Aquela mãe, pai que criou seus filhos e hoje retorna, aquele adolescente em conflito com a lei que precisa ser acolhido, mulheres em situação de violência doméstica, idosos que buscam novos conhecimentos, entre tantas outras”, esclarece a diretora do Centro de Medianeira.
Jaine Campos é aluna do CEEBJA desde janeiro deste ano, cursando o 8º e 9º anos do Ensino Fundamental. “Parei de estudar em 2014, porque comecei a trabalhar e não consegui conciliar as duas coisas. Decidi retomar os estudos, pois quero ter oportunidades de carreira profissional e, assim, poder proporcionar uma vida melhor para o meu filho. E esta oportunidade encontrei no CEEBJA, pois é uma escola que atende jovens e adultos que trabalham. Depois que tomamos uma decisão tão importante em nossa vida, muitas coisas mudam e a retomada dos estudos nos dá esperança de um futuro melhor e nos proporciona uma sensação de crescimento e uma satisfação em poder concluir os estudos”, ressalta.
Assim como outros alunos, Jaine destaca que o Centro tem professores altamente capacitados para o modelo de educação para jovens e adultos trabalhadores. “A maioria dos meus colegas trabalha em indústrias da nossa cidade e de cidades vizinhas. E o CEEBJA é especializado para nos atender. Caso haja o fechamento, muitos sonhos de um futuro melhor serão desfeitos, pois este modelo de educação que temos hoje nos proporciona toda a flexibilidade que precisamos para encaixar os estudos na nossa rotina corrida”, finaliza.
SAIBA MAIS
DIFERENÇAS ENTRE CEEBJA E EJA – A diretora do CEEBJA de Medianeira, Inês Tereza Menegazzo, esclarece as diferenças entre CEEBJA e EJA.
“A EJA é uma categoria organizacional constante da estrutura da educação nacional, com finalidades e funções específicas. Tanto a EJA quanto os CEEBJAs tratam da Educação de Jovens e Adultos. Porém, o que para muitos parece a mesma coisa, há uma sutil diferença que é muito importante. Temos a EJA dos anos iniciais que funciona no Colégio Municipal Ulisses Guimarães e que é de competência do município e, como tal, lá trabalham professores que estudam e adotam metodologias específicas para jovens e adultos, o que é muito diferente das metodologias aplicadas para a alfabetização infantil. Veja: ambas tratam de alfabetização, porém deixo uma pergunta para provocar a reflexão do leitor: uma pessoa de 40 anos e uma criança de 6 anos aprendem da mesma forma? Um adulto de 50 anos e um adolescente de 12 anos tem as mesmas experiências de vida? E poderíamos nos estender ainda em muitos outros questionamentos acerca das diferenças entre ambas. São reflexões pertinentes na medida que, ao tratar do mesmo assunto, alfabetização, obrigatoriamente devem ser adotadas metodologias de ensino diferentes”, explica.
Segundo ela, a metodologia da Andragogia não é equivalente, ela contrapõe a metodologia aplicada no ensino de crianças. “Então, dizer que um Centro especializado em Jovens e adultos é a mesma coisa que uma Escola seriada que oferta EJA em um dos períodos, com equipe pedagógica, professores e funcionários que desenvolvem metodologias para crianças e adolescentes é se equivocar, se for leigo, e usar de má fé se for educador. Vejamos outro exemplo que busco na área da saúde. Imagine um pediatra fazendo às vezes de um geriatra, ou vice versa, ou ainda uma clínica especializada em oftalmologia ser “alocada” para um espaço onde somente o clínico geral atende. É, no mínimo, cega esta visão do gestor! E se juntássemos as secretarias de educação, esporte e assistência social aqui em nosso município? Aparentemente os leigos diriam: ‘Otimizou os espaços, reduziu custos etc…’ Precisamos refletir sobre o retrocesso dessa proposta para o usuário, para o contribuinte, para a população que busca e precisa destes serviços e suas respectivas especialidades. Então, hoje, fechar um Centro de Educação para Jovens e adultos e “alocar” os alunos para uma escola seriada é tratar de sufocar ainda mais a EJA do município e região, que precisam urgentemente de ampliação para o período diurno. Demanda temos, basta olhar o vertiginoso crescimento das indústrias e empresas em nosso município e região e que têm trabalhadores que precisam retomar seus estudos”, salienta Inês.
A diretora do CEEBJA de Medianeira destaca ainda que, além desse público trabalhador, há também adolescentes que não estão no mercado de trabalho, “porém são muito ‘grandes’, como costumamos ouvir por aí, para permanecer estudando com a criança de 11 ou 12 anos. E são estes que estão querendo alocar naquela mesma escola que não suportou trabalhar metodologicamente diferente e o aconselhou a procurar o CEEBJA, são estes que hoje procuram justificar que, ao transferir estes alunos que inúmeras vezes foram alijados de espaços comuns a todos, são estes que usam a justificativa: ‘Não muda nada!’ Hora, pois, se não muda nada, por que irão mexer? Se não muda nada, por que mudar? Nem mudança de local tem, então para que mudar? São reflexões que cada um deve fazer e tentar encontrar respostas”.
Para Inês Tereza Menegazzo, a sutil diferença que faz toda a diferença se chama respeito. “Respeito por esse contribuinte que tem direito à escolarização formal, seja em que período for da vida e com a metodologia correta para sua idade. Não é um favor, é uma obrigação legal do Estado preconizada na Constituição Federal, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nas metas do Plano Nacional de Educação, no Estatuto da Criança e do Adolescente e tantas outras leis infraconstitucionais vigentes”, reforça.
Ela complementa que muitos alunos do CEEBJA já passaram pela escola regular seriada e não se adaptaram por motivos diversos. E agora estão pretendendo que voltem para a mesma organização, para a mesma metodologia, para a mesma escola onde eles não conseguiram se adequar. É, no mínimo, um retrocesso camuflado de otimização. “O que vou escrever aqui, talvez esteja distante de muitos, mas é parte do cotidiano do jovem, adulto ou idoso que frequenta o CEEBJA: Sabe aquele lanche especial que é pensado e feito pra ti, que veio direto do serviço para o colégio sem ter tempo de passar em casa, ou se passou em casa, mal conseguiu tomar um banho e pegar os cadernos para ir para colégio? Esse lanche na entrada e o jantar faz parte da pauta metodológica do acolhimento ao aluno. Sabe aquela pedagoga que já tem mais de 60 anos e que entende de sobra tuas aflições? Faz parte da pauta do respeito e acolhimento do aluno do CEEBJA. Sabe aquele professor que, por vezes, diminui o ritmo dos conteúdos, pois teu raciocínio já não é mais aquele da adolescência? Faz parte da pauta do respeito ao teu ritmo e da acolhida ao teu conhecimento de vida que, por muitas vezes, se sobrepõe ao conteúdo científico. Sabe aquele funcionário que te acolhe na matrícula e te incentiva a não só pegar uma declaração de matrícula para o trabalho, mas participar das aulas e procurar não faltar? Faz parte de uma metodologia pensada para o atendimento do aluno do CEEBJA. Sabe aquela funcionária que limpa as salas, corredores e banheiros e que, por vezes, conversa contigo no corredor e que te pede para voltar à sala? Faz parte da pauta metodológica para o acolhimento com respeito ao aluno e, por fim, sabe aquela diretora que te abre os dois braços e te diz: aproveita e abraça essa oportunidade que, talvez, seja a última que tu vais ter? Faz parte da metodologia de ensino pensada para o aluno do CEEBJA. E tantas outras metodologias pensadas para o teu acolhimento nessa escola, que é pensada para jovens, adultos e idosos”, defende a diretora. Inês finaliza afirmando que Medianeira e região não podem permitir o barateamento do processo educacional, como motivação para que percam o CEEBJA.
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